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quinta-feira, 28 de julho de 2011

O canto do galo

Hoje eu fui acordada pelo cantar de um galo à beira da minha janela, logo na primeira manhã das minhas férias em Minas.
Seu canto me despertou para as memórias de infância e num instante pareceu que o passado se fez presente. Eu podia ouvir a voz rouca de minha avó conversando na cozinha, ao lado do velho rádio chiado. Eu podia até mesmo sentir o cheiro doce do café com leite que ela preparava, e que parecia ser o único motivo a me fazer levantar da cama quentinha e enfrentar o frio da manhã de inverno.
Senti que aquele canto do galo era um privilégio meu naquela manhã. Apesar de que, mesmo morando na capital, ainda tenho o prazer de receber a visita dos beija-flores e canarinhos que vem cantar em minha janela, enamorados da água doce que deixo para eles todos os dias. Mesmo assim, o canto daquele galo me pareceu um som inusitado para quem há tempos não o ouvia de tão perto.
E esse som é também o som de minha infância, das noites de "posar" na casa da vó e encontrar as primas. De comer as quitandas gostosas, o pão fresquinho, a goiabada mole dentro do pão. De subir na goiabeira pra brincar de esconde-esconde, e nos intervalos provar da fruta madura.
E é por isso que esse canto rouco ainda é para mim uma doce nostalgia.

quinta-feira, 31 de março de 2011

O que me falta

A solidão me persegue a vida toda. Apaixonada por mim, não me deixa onde quer que eu vá. Mesmo quando encontrei um verdadeiro amor e achei que, tendo alguém comigo todos os dias de minha vida, eu jamais estaria só, ainda assim, ela encontrou forças para me arrebatar.

E fez uma troca comigo: consegui um amor e perdi todos os amigos. Ela me exilou na mais bela cidade do mundo, para que eu a encontrasse como minha companheira, e dela bebesse como água essencial à vida, e dela fizesse a minha inspiração.

Assim ficamos eu e ela, e só me restou as palavras e todo espaço em branco para preencher... infinito...

As palavras me acompanham nessa luta, mas muitas vezes elas também fogem. Faltam palavras para expressar o que sinto, esse nó na garganta que desce para meu peito e me aperta, como se meu coração ficasse menor, fazendo o sangue escorrer devagar pelas minhas veias, como se um fino ferro fervente corresse pelo meu corpo.

A minha vida passa sem sentido, à procura de paz, à procura do que me falta para sentir-me completa, preenchida. Quero aprender a ser feliz apenas comigo mesma, encontrando em mim a melhor companhia.

Nesses momentos em que me deixo levar pela dor, começo a sentir a falta de todos aqueles que fazem parte da saudade profunda que sinto dos que se foram.

E tudo me falta de maneira tão dolorida... O carinho de mãe, o colo de vó, as histórias de vô, as brincadeiras de irmãos, as comidinhas do pai, o pão de queijo da tia, as conversas com as melhores amigas. E os irmãos que encontrei pelo caminho e achei que fossem pra sempre.

E o que fica são memórias de bons momentos vividos, mas a lembrança de que sempre me faltou algo.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Crônica - Estrangeira


Voltar às origens nos faz perceber o quanto a distância nos modificou. Aquele que deixa sua cidade natal, seu berço, sente uma saudade imensa de detalhes do cotidiano – broa de fubá, doce de leite caipira, pamonha de feira, biscoito de polvilho... Doce sabor de infância! Quentão de festa junina, cocada de festa de São Benedito, garapa da praça... A rua enfeitada pelas quaresmeiras em flor, o colorido dos ipês e seu tapete de flores efêmeras caídas ao chão. O frescor da água mineral tomada direto da mina.
Quando percebemos que todas essas coisas que no passado fizeram parte do cotidiano agora se tornaram especiais, pedaços de memória, doces lembranças, aí a gente percebe que se tornou um pouquinho estrangeiro, porque olha sua casa com olhos de visitante, de turista, que admira aquilo que é diferente, exótico, o que não encontra igual em sua terra.
E como também nos sentimos estrangeiros na terra adotiva, percebe-se que se é estranho em todo lugar, e que já não há mais um lugar para se chamar de seu.
Perde-se a casa, um pouco da identidade, e vive-se sempre à espera de um retorno – mas pra onde?


“O homem que acha a sua pátria agradável não passa de um jovem principiante; aquele para quem todo solo é como o seu próprio já está forte; mas só é perfeito aquele para quem o mundo inteiro é como um país estrangeiro”. 
(Ideal de 
Hugues de Saint-Victor, formulado no século XII. In.: 
TODOROV, 1988, p.245)