quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Diálogo da alma


Percebe o silêncio?
Nele há mais vida
Que na cidade cheia de pessoas, carros, ruídos, vozes
Nele há mais sinceridade
Que numa conversa entre amigos
Porque no silêncio ecoa
A sinceridade dos pensamentos,
O sopro mais puro de vida,
O diálogo da alma...

14/01/2014

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Publicação na editora Mosarte

Caros:
É com felicidade que informo que alguns dos textos publicados neste blog agora fazem parte de uma coletânea de textos da Editora Mosarte. A coletânea intitulada No espaço e no tempo traz textos inéditos de jovens escritores, constituída pelo que os editores chamam de "mosaico de estilos e gêneros literários diversos".
É a primeira publicação em livro impresso desta autora.

Agradeço a todos que foram os primeiros leitores dessa pulsão de narrar, e à Editora Mosarte pela oportunidade dada aos anônimos amantes das letras.

Abraços a todos!

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

PLENA PAUSA

Um homenagem às minhas páginas em branco que gritam e esperam por mim... peço que me aguardem e me perdoem!

PLENA PAUSA

Lugar onde se faz
o que já foi feito,
branco da página,
soma de todos os textos,
foi-se o tempo
quando, escrevendo,
era preciso
uma folha isenta.
Nenhuma página
Jamais foi limpa
Mesmo a mais Saara,
ártica, significa.
Nunca houve isso,
uma página em branco.
No fundo, todas gritam,
pálidas de tanto.

(LEMINSKI, 2002, p.29)

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Aos trinta anos



Havia apenas uma semana que eu tinha completado trinta anos e precisei, por motivos burocráticos, ver a certidão de óbito de minha mãezinha. Foi então que eu me assustei: ela faleceu aos trinta anos.
Uma sensação de finitude tomou conta de meus pensamentos, de todo meu ser, e um calafrio percorreu o meu corpo. Não era o medo apenas da morte inesperada chegar até mim. Era o medo dela me encontrar sem ter vivido, sem ter sonhado, sem ter produzido ou deixado um legado neste mundo. Afinal, quando mamãe faleceu, ela já tinha três filhos e eu não tenho nenhum; ela já era uma mulher vivida, enquanto eu ainda me sinto uma jovem garota.
            Mamãe tinha muito medo do envelhecimento, das rugas, das marcas do tempo e da gravidade. Eu não me lembro dela, mas as histórias que me contaram sempre retrataram alguém muito vaidosa e bonita. Talvez por isso ela tenha morrido tão jovem... De certo modo teve seu pedido atendido, porque ela foi levada ao céu antes que os dedos do tempo tocassem sua face perfeita.
            O meu temor não é o passar do tempo e a vaidade de ver os anos levarem a juventude de nosso rosto. Meu medo sempre foi o de passar por essa vida sem produzir, sem deixar um legado e por isso cair no esquecimento. Passar por esse mundo sem deixar alguém que se lembre de nós, para permanecermos vivos nessas memórias. Minha mãe revive hoje quando eu escrevo. E reviverá cada vez que alguém se lembrar dela. Porque hoje, sem nenhuma foto guardada e sem memória de seu rosto, o que faz com que ela seja lembrada são suas histórias e seus genes no meu corpo. Dizem que sou muito parecida com ela. Então, para aqueles que com ela conviveram, olhar no meu rosto é relembrá-la, e assim ela vive mais uma vez na lembrança daquele que me olhou. Eu sou, assim, um pouco dela, um pouco de história e memória.

            Eu já sabia – aliás, desde de Balzac -  que os trinta anos eram significativos na vida de uma mulher, que era o marco de sua maturidade, da busca de felicidade de realizações pessoais. Para mim, essa idade adquiriu maior significância depois que descobri que foi a idade fatal para minha mãe. Apresentou-se como um aviso de que a vida passa rápido demais, de que juventude de nada vale se não houver uma história bem vivida, se não deixarmos vestígios de uma existência nesta terra. Hoje, vivo com uma ansiedade de fazer tudo acontecer rapidamente, de viver intensamente todas as experiências que a vida pode proporcionar, como quem tem uma sentença de morte, uma doença incurável, poucos dias de vida. Beijo meu marido todos os dias pela manhã como se nunca mais fosse vê-lo. Respondo aos meus amigos com a intensidade de sentimentos de quem se comunica pela última vez. E agradeço a cada amanhecer pela simples oportunidade de ver um novo dia.

terça-feira, 23 de julho de 2013

Com Roberto Drummond


Recordo-me da primeira vez que tive um encontro com um verdadeiro escritor. Eu era apenas uma adolescente cheia de sonhos e de uma vida a acontecer, que estava empolgada com meu primeiro prêmio de crônicas e poesias que havia ganhado numa seletiva local. Foi então que conheci Roberto Drummond em um evento literário “O escritor por ele mesmo”. Ao final do encontro, enchi-me de coragem e falei para ele que eu escrevia algumas coisinhas e que gostaria muito de ser escritora um dia. Ele me autografou um CD de leituras de trechos de sua obra dizendo: “Para Aline, esperando um livro seu”. Eu realmente saí daquele evento acreditando que um dia eu levaria para ele uma publicação minha e diria que ele me inspirou a acreditar.  Mas ele já faleceu há muitos anos e eu deixei de acreditar em minha publicação.
Com o passar dos anos, a gente deixa de acreditar nos sonhos e fica cada vez mais crítico quanto ao que fazemos. Quanto mais eu estudei literatura, menos literatura produzi. Quanto mais leituras eu fiz, mas vi como meus escritos se distanciam da obra de arte. E por muitos anos neguei a folha em branco.
Mas a necessidade de escrever incomoda e cresce dentro do escritor. Eu chamo de uma pulsão narrativa vontade de narrar, de contar, mesmo que não seja apresentado a ninguém. É como uma necessidade vital de libertação, de rememoração, de conhecimento de si, dos outros, do mundo, de organizar suas memórias, ou de criar memórias do gostaria que tivesse sido a vida. É quase patológica a necessidade de escrever.
Essa pulsão é o que nos faz superar o medo da publicação. Porque publicar é expor-se à crítica, e o ser humano tende a uma necessidade imensa de aprovação. Eu queria ter tido a aprovação de Roberto Drummond e, naquele dia, ele aprovou-me previamente, muito antes de ter lido qualquer coisa que eu tivesse escrito. Ele aprovou o meu sonho, a minha coragem, o meu desejo de escrever.  
O que impediu meu sonhos de florescer foram meus medos. Mas nenhum de meus medos supera a angústia do silêncio. Descobri assim que, na verdade, o que me assusta não é o medo da desaprovação, da exposição dos sentimentos de nossa história pessoal. O que mais me assusta é o indizível, toda espécie de sensação que não encontra nas palavras substância suficiente para expressá-la. O que me assusta é o silêncio.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Milton Hatoum e Graciliano Ramos

A Festa Literária Internacional de Paraty -  FLIP 2013 -  escolheu Graciliano Ramos para ser o homenageado da edição. O escritor Milton Hatoum abriu a 11ª edição da feira com uma palestra sobre o escritor alagoano, que publicou clássicos da literatura nacional como Vidas Secas, Angústia, Infância, Memórias do Cárcere, dentre outros. 

Milton já havia falado em outras ocasiões (em palestras, crônicas e entrevistas) da sua admiração por Graciliano Ramos, de sua importância para a literatura regionalista nacional e de sua influência nos seus próprios escritos. Ainda este ano de 2013, no SESC/Araraquara, Hatoum falou durante sua palestra que a influência  de Graciliano foi fundamental para a criação de narrador de Dois Irmãos, que não pertence à elite, nem à classe média, um narrador diminuído, de uma vida diminuída, de um humilhado pela vida que é salvo pela educação dada pelo seu avô. Essa característica de seu narrador veio dos narradores de Graciliano, que deu voz às minorias humilhadas.

Disse Hatoum em entrevista:
"Graciliano, a meu ver, é uma das figuras centrais da literatura brasileira. A nossa literatura já tem, vamos dizer, grandes nomes, grandes obras. E a obra de Graciliano eu acho que está no centro do vértice dessa pirâmide. Ela é uma obra universal. Parte do local para alcançar o universal e ela, ao mesmo tempo, foi uma ruptura na literatura brasileira. Porque no Graciliano, o que quê ele conseguiu foi casar a expressão com aquilo que ela se refere da linguagem. Quer dizer há um casamento aí perfeito entre o estilo, entre a linguagem e a realidade que ela quer exprimir. Ele soube falar do essencial dos dramas humanos de uma forma concisa e deixar apenas o caroço mesmo."  (http://www.pactoaudiovisual.com.br/mestres_final/graciliano/transcricao.htm)
A aproximação entre os dois escritores, tão distantes no tempo quanto no estilo da escrita, já havia sido pensada anteriormente por alguns críticos, dentre eles, Tânia Pellegrini no artigo "Regiões, margens e fronteiras: Milton Hatoum e Graciliano Ramos", publicado no livro Despropósitos: estudos de ficção brasileira contemporânea, que aparentemente está indisponível nas livrarias, mas encontra-se disponível no google books*.

Nesse artigo, Tânia Pellegrini afirma que é possível aproximar as obras de Graciliano e Hatoum na representação de "territórios extremos" que são transformados em "regiões literárias", pela representação de territórios únicos, diversos em sua unidade, com histórias, culturas e geografias próprias, espaços que ao mesmo tempo são tão reais e simbólicos, nos quais os personagem se encontram e se desencontram, entretecendo relações identitárias próprias de cada lugar. Outra aproximação que pode ser feita entre os dois escritores, está na criação dos narradores, já confessada por Hatoum a influência de Graciliano em muitos deles. Porém, talvez a maior aproximação que se possa fazer entre os dois escritores esteja na capacidade de dirimir margens e fronteiras enquanto produzem uma literatura que tende ao contrário, ao escolherem retratar realidades peculiares de regiões específicas. A capacidade de ambos de retratar as particularidades regionais de cada personagem ao mesmo tempo que exploram a complexidade da existência humana, universal.

Aproveito a oportunidade da Flip para sugerir a leitura desse artigo e convidá-los a pensar sobre essas aproximações entre os dois autores:

* PELLEGRINI, Tânia. Regiões, margens e fronteiras: Milton Hatoum e Graciliano Ramos. In.: _____ Despropósitos: estudos de ficção brasileira contemporânea. São Paulo: Anablume; Fapesp, 2008.
Disponível em: http://books.google.com.br/


domingo, 9 de junho de 2013

Livros de verão e literatura de verdade - por Milton Hatoum

"Livros de verão e literatura de verdade"
(Por Milton Hatoum)

"Há poucos meses atrás, na Feira do Livro de Guadalajara, vi uma cena que, de algum modo, diz muito sobre a literatura e a solidão, essas irmãs siamesas.

A Feira estava cheia de gente, mas não necessariamente de leitores. Ao visitar o estande de uma editora, vi um escritor de língua espanhola, sentado diante de uma mesinha, à espera de leitores. Ele tinha um ar desolado e conversava com uma mulher. Quando eu passava perto dos dois, ele perguntou à mulher onde estavam os leitores. Ela sorriu e apontou para uma fila de leitores excitados, que queriam comprar a edição espanhola de Cinquenta Tons de Cinza, o best-seller do momento.

É improvável que os leitores dessas historinhas de sexo e violência - ou sexo com violência - leiam romances de Conrad, de Dostoievski ou de Graciliano Ramos. Quantos se aventuram a ler Coração das Trevas, Crime e Castigo ou Infância? Para a maioria dos leitores, um livro de ficção é puro entretenimento, algo que não convida a pensar nas relações humanas, no jogo social e político, na passagem do tempo e nas contradições e misérias do nosso tempo, muito menos na linguagem, na forma que forja a narrativa. Talvez por isso o poeta espanhol Juan Ramón Jiménez tenha afirmado que a poesia é a arte da imensa minoria. Isso serve para a literatura e para todas as artes. Os poucos, mas felizardos espectadores da peça O Idiota, dirigida por Cibele Forjaz, sabem disso.

Flaubert costumava lamentar a época em que viveu: a crença entusiasmada e cega no progresso e na ciência, as batalhas fratricidas na França, a carnificina das guerras imperialistas, e a idiotice e bestialidade humanas, que ele explorou com ironia em sua obra. Em uma carta de sua vasta correspondência, escreveu que o ser humano não podia devorar o universo. Referia-se ao consumismo crescente na segunda metade do século 19.

O que o "Ermitão de Croisset" diria dos dias de hoje, quando a propaganda insidiosa na tevê não poupa nem as crianças e tudo gira em torno da vida de celebridades, de uma fulana famosa que teve um bebê, de sicrano que se separou de beltrana ou traiu uma fulaninha? Qual o interesse em saber que a princesa da Inglaterra está grávida?

Essas baboseiras são ainda mais graves num país como o Brasil, cuja modernidade manca ou incompleta exclui milhões de jovens de uma formação educacional consistente.

No começo da década de 1990, quando eu passava uma temporada em Saint-Nazaire, um jovem operário entrou no meu apartamento para consertar o vazamento de uma tubulação. Quando passou pela sala, viu um romance em cima da mesa e exclamou:

 - Ah, Stendhal. Li vários livros dele, e o que mais aprecio é esse mesmo: A Cartuxa de Parma.

 - E onde você os leu? Quando?

 - Aqui mesmo, ele disse. Na escola secundária.

 - Era uma das escolas públicas daquela pequena cidade no oeste da França.

Nicolas Sarkozy e outros presidentes conservadores tentaram prejudicar o ensino de literatura e ciências humanas na escola pública francesa, mas nenhum deles teve pleno êxito. Aprender a ler e a pensar criticamente é um dos preceitos de uma sociedade democrática, e esse mandamento republicano ainda vigora na França. O que os prefeitos e secretários de Educação dos quase 5.700 municípios brasileiros dizem a esse respeito?

A precariedade da educação pública é um dos problemas estruturais da América Latina. Até mesmo a Argentina, que já foi uma exceção honrosa, começa a padecer desse mal.

Comecei essa crônica evocando a solidão de um escritor em Guadalajara. Melhor assim: a solidão está na origem do romance moderno, é um de seus pilares constitutivos e faz parte do trabalho da imaginação do escritor e do leitor.

O tempo se encarrega de apagar todos os cinquenta tons de cinza, e ainda arrasta para o esquecimento os crepúsculos, cabanas e toda essa xaropada que finge ser literatura. Enquanto isso, Coração das Trevas, publicada há mais de um século, é uma das novelas mais lidas por leitores de língua inglesa."

Fonte: 
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,livros-de-verao-e-literatura-de-verdade-,980457,0.html
Acesso em 08 de janeiro de 2012