quinta-feira, 22 de setembro de 2022

Casa de vó

 

O cheiro do café passado no coador

Esperando a casa acordar

A goiabada cascão mole

Pra passar no pão

Pão doce e fofo

Como as mãos que o amassaram.

 

A varanda pra quentá sol depois do almoço

Olhar a rua

Falar da vida

Olhar para as montanhas

Ouvir histórias.

 

O fogão à lenha

Feito de barro e pelas mãos da vó

Meu fogãozinho de brinquedo, igual, fazendo fumaça

E assando bolo de barro.

 

As galinhas cacarejando

E a gente, criança, pegando o ovo quentinho

A goiaba no pé

E o medo do bicho da goiaba.

 

O colo da vó...

Suas pernas curtinhas serviam de escorregador 

Na saia lisa feita por ela

As meias quase sempre rasgadas nas havaianas azuis

A tesoura que recortava um papel que fazia mil menininhas de mãos dadas.

 

Os programas de culinária que víamos juntas

E as receitas que nunca fazíamos

Os conselhos que ela me dava

 E eu nunca ouvia

Tanta sabedoria

Que só agora eu soube

E sinto.

 

O riso contido

O olhar perdido

As histórias guardadas

Caladas

Suas dores solitárias

Ainda pulsam

Nas paredes da casa.


Aline Magalhães


 

terça-feira, 16 de agosto de 2022

 

O corpo

 

O corpo maduro de quem gerou uma vida

E viveu tantas outras

Se desdobra todos os dias

E vira armadura

 

Esse corpo que é meu

Mas também é da vida gerada

Da boca alimentada

Se divide em outros corpos

 

O corpo que gera corpos

O corpo que guarda corpo

O corpo divido

Ainda é meu, corpo.


 


quarta-feira, 1 de junho de 2022

 É com imensa alegria que farei parte da Antologia Poesia Viva, publicada pelo coletivo Fomento literário. O coletivo é uma iniciativa maravilhosa que promove a publicação e divulgação de novos escritores. Quem quiser saber mais do coletivo e da antologia acesse https://coletivofomentoliterario.blogspot.com/

Obrigada pela oportunidade!

#poesiaviva



sexta-feira, 3 de dezembro de 2021

O escaravelho sagrado

 


 

Minha rigidez é uma armadura

Calcificação dos traumas e perdas

Que o tempo depositou em minha alma

 

Se hoje não transpareço a suavidade e doçura que outrora tive

É porque amargaram minha boca com o gosto acre das más notícias

E minhas mãos se engrossaram do trabalho para sobreviver.

 

Se hoje eu sorrio pontualmente

E sou conhecida pelo mau humor tradicional

É por medo de perder o sonho na estrada, novamente

 

Minha carapaça foi construída pelo acúmulo de golpes do tempo

Me protejo nessa casca, mas não encolho

Rígida, sigo a passos lentos e constantes

Como um escaravelho sagrado