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segunda-feira, 8 de julho de 2013

Milton Hatoum e Graciliano Ramos

A Festa Literária Internacional de Paraty -  FLIP 2013 -  escolheu Graciliano Ramos para ser o homenageado da edição. O escritor Milton Hatoum abriu a 11ª edição da feira com uma palestra sobre o escritor alagoano, que publicou clássicos da literatura nacional como Vidas Secas, Angústia, Infância, Memórias do Cárcere, dentre outros. 

Milton já havia falado em outras ocasiões (em palestras, crônicas e entrevistas) da sua admiração por Graciliano Ramos, de sua importância para a literatura regionalista nacional e de sua influência nos seus próprios escritos. Ainda este ano de 2013, no SESC/Araraquara, Hatoum falou durante sua palestra que a influência  de Graciliano foi fundamental para a criação de narrador de Dois Irmãos, que não pertence à elite, nem à classe média, um narrador diminuído, de uma vida diminuída, de um humilhado pela vida que é salvo pela educação dada pelo seu avô. Essa característica de seu narrador veio dos narradores de Graciliano, que deu voz às minorias humilhadas.

Disse Hatoum em entrevista:
"Graciliano, a meu ver, é uma das figuras centrais da literatura brasileira. A nossa literatura já tem, vamos dizer, grandes nomes, grandes obras. E a obra de Graciliano eu acho que está no centro do vértice dessa pirâmide. Ela é uma obra universal. Parte do local para alcançar o universal e ela, ao mesmo tempo, foi uma ruptura na literatura brasileira. Porque no Graciliano, o que quê ele conseguiu foi casar a expressão com aquilo que ela se refere da linguagem. Quer dizer há um casamento aí perfeito entre o estilo, entre a linguagem e a realidade que ela quer exprimir. Ele soube falar do essencial dos dramas humanos de uma forma concisa e deixar apenas o caroço mesmo."  (http://www.pactoaudiovisual.com.br/mestres_final/graciliano/transcricao.htm)
A aproximação entre os dois escritores, tão distantes no tempo quanto no estilo da escrita, já havia sido pensada anteriormente por alguns críticos, dentre eles, Tânia Pellegrini no artigo "Regiões, margens e fronteiras: Milton Hatoum e Graciliano Ramos", publicado no livro Despropósitos: estudos de ficção brasileira contemporânea, que aparentemente está indisponível nas livrarias, mas encontra-se disponível no google books*.

Nesse artigo, Tânia Pellegrini afirma que é possível aproximar as obras de Graciliano e Hatoum na representação de "territórios extremos" que são transformados em "regiões literárias", pela representação de territórios únicos, diversos em sua unidade, com histórias, culturas e geografias próprias, espaços que ao mesmo tempo são tão reais e simbólicos, nos quais os personagem se encontram e se desencontram, entretecendo relações identitárias próprias de cada lugar. Outra aproximação que pode ser feita entre os dois escritores, está na criação dos narradores, já confessada por Hatoum a influência de Graciliano em muitos deles. Porém, talvez a maior aproximação que se possa fazer entre os dois escritores esteja na capacidade de dirimir margens e fronteiras enquanto produzem uma literatura que tende ao contrário, ao escolherem retratar realidades peculiares de regiões específicas. A capacidade de ambos de retratar as particularidades regionais de cada personagem ao mesmo tempo que exploram a complexidade da existência humana, universal.

Aproveito a oportunidade da Flip para sugerir a leitura desse artigo e convidá-los a pensar sobre essas aproximações entre os dois autores:

* PELLEGRINI, Tânia. Regiões, margens e fronteiras: Milton Hatoum e Graciliano Ramos. In.: _____ Despropósitos: estudos de ficção brasileira contemporânea. São Paulo: Anablume; Fapesp, 2008.
Disponível em: http://books.google.com.br/